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paulabernardi46

Sonhos: A linguagem simbólica do inconsciente

E se eu te dissesse que os sonhos não são um produto inútil do que o seu cérebro joga fora enquanto você dorme? Os sonhos têm um papel fundamental na saúde psíquica. Por muito tempo acreditou-se que os sonhos eram apenas restos de acontecimentos, memórias, e desejos reprimidos que o cérebro filtrava e “jogava fora” durante o sono R.E.M.


Hoje, com a evolução da ciência sabemos um pouco mais sobre isso. O sono R.E.M. é o momento mais profundo do sono, no qual verdadeiramente descansamos, e que, se privados por muito tempo desse momento no nosso sono, podemos adoecer e até morrer. Esse momento no sono é quando ocorre a força reparadora do cérebro. É quando o corpo restaura sua “homeostase”, que é como o status quo do corpo. Durante esse período, nós sonhamos.

Antes que eu receba enxurradas de mensagens de leitores alegando não sonhar, deixem que eu esclareça: Todo. Mundo. Sonha. É claro, que por uma função conservadora da consciência, às vezes não nos lembramos dos sonhos. Ou às vezes, nos lembramos apenas ao acordar, e logo na sequência, esquecemos. O sonho tem muito valor para a análise na psicologia analítica e é fundamental como ferramenta de compreensão do inconsciente.


Muito embora a maior parte das pessoas não veja muita relevância em sonhar com um donut montado num dragão num céu vermelho, cada uma dessas coisas é um símbolo que possuí uma representação própria para cada indivíduo. O inconsciente tem uma linguagem própria para se manifestar. E ele aproveita os momentos de rebaixamento da consciência para se colocar. É como se a consciência fosse um gato à espreita de um rato. Quando o gato dorme, é quando o rato pode sair da toca e fazer o que quer. A linguagem dos sonhos, é a linguagem dos símbolos.

Seria tão mais fácil se o inconsciente falasse conosco na mesma linguagem que nós usamos, não é mesmo? Mas, infelizmente, temos um censurador bastante potente que faz a intermediação das informações entre o mundo externo e interno, o Ego. Ele é responsável por tudo que você lembra ou esquece. (Não vale usar isso de desculpa na prova!) É porque temos um censurador tão eficiente que o inconsciente tem que se manifestar de forma a passar pela censura “impune”. O inconsciente quer nos mandar recados importantes para nosso avanço pessoal, mas ele faz isso de forma criptografada.


O símbolo é, para Jung (2008, p. 18/19):


[O símbolo é] um termo, um nome ou mesmo uma imagem que nos pode ser familiar na vida cotidiana, embora possua conotações especiais além do seu significado evidente e convencional. Implica alguma coisa vagam desconhecida ou oculta para nós
[...]
Assim, uma palavra ou uma imagem é simbólica quando implica alguma coisa além do seu significado manifesto e imediato.
[...]
Por existirem inúmeras coisas fora do alcance da compreensão humana é que frequentemente utilizamos termos simbólicos como representação de conceitos que não podemos definir ou compreender integralmente.

 

            Ou seja, símbolo é qualquer imagem, ou palavra que expresse alguma coisa além da compreensão humana. Pode-se concluir, portanto, que a habilidade de simbolizar é inata e, até onde se sabe, exclusiva do ser humano. Os sonhos são, por excelência, manifestações dessa linguagem intangível e simbólica.


            Sigmund Freud, foi o primeiro pesquisador a se ater ao estudo dos sonhos, iniciando seus estudos com o uso da ferramenta de livre-associação. Pedia-se ao sonhador que contasse o sonho. Então, Freud, pegaria os elementos e pediria ao sonhador que associasse as imagens do sonho com o que lhe viesse à mente. E a partir daí, analisariam.


            Jung, motivado pelos estudos de Freud, foi um pouco mais adiante, já que Freud definiu os sonhos como "uma realização (disfarçada) de um desejo (reprimido)". Jung acreditava que os sonhos não eram apenas uma realização disfarçada de um desejo, mas sim, uma manifestação do inconsciente. E que a razão pela qual seria “difícil” entender seus conteúdos é porque sua linguagem é própria e rica em metáforas e arquétipos. Jung também acreditava que o sonho só poderia ser “decifrado” pelo sonhador. Sua função como analista era ajudar na ampliação dos símbolos dos sonhos de seus pacientes.


            Sobre isso, Robert Hopcke (2023, p. 37), nos ensina:

Jung via a grande maioria dos sonhos funcionando psicologicamente de maneira compensatória. Ao apresentarem a situação interior da psique de modo a trazer essa situação para o conhecimento consciente e integrado dentro do indivíduo, os sonhos servem para compensar aquilo que pode ter se perdido dentro da consciência.

 

É importante ressaltar que o Jung e nós, analistas junguianos, analisamos um conjunto de sonhos e não um sonho isolado. Os sonhos podem ser interpretados de duas maneiras: objetivamente, em referência à uma situação externa da vida do sonhador, ou subjetivamente, como uma representação da situação ou do processo interior do sonhador.

O próprio Jung sempre defendeu a característica singular dos sonhos. E embora o mundo onírico (como é chamado cientificamente o mundo dos sonhos), seja dotado de simbolismos, o simbolismo é construído de forma individual, sendo que nenhum dicionário dos sonhos vai ser eficiente para interpretar a vastidão das representações individuais.

Seria muito reducionista e leviano sugerir que um dicionário que diz: “Se sonhar com cobra significa que xyz”. A cobra, tal qual outros símbolos milenares têm representações muito mais profundas e individuais, que permeiam, tanto a experiência pessoal, como a cultura no qual o indivíduo está inserido.


Já pensou em ter um diário dos sonhos? Jung sempre recomendou aos seus pacientes que anotassem seus sonhos logo ao acordar e levassem para análise. Pode ser uma experiência enriquecedora!


Referências: JUNG, Carl Gustav. O homem e seus símbolos. 2 Ed. Especial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008.

HOPCKE, Robert H. Guia para a obra completa de C. G. Jung. 3 Ed. Petrópolis: Vozes. 2012.



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